12 janeiro 2014

Comissão das rendas propõe mudar regime de despejo por obras


Relatório avança com várias sugestões para o arrendamento não habitacional. Para as obras profundas, propõe ainda um pré-aviso mais alargado.

A Comissão de Monitorização da Reforma do Arrendamento Urbano está preocupada com os despejos de estabelecimentos comerciais com o fundamento na realização de obras de remodelação ou restauro profundos que obriguem à desocupação do imóvel. Perante a manifesta existência de algum abuso no que respeita ao fundamento da denúncia dos contratos nestes casos, sugere a Comissão que esse fundamento seja revisto pelo legislador. Esta é uma das medidas propostas no relatório relativo ao arrendamento não habitacional que foi aprovado sexta-feira numa reunião da Comissão. 

Recorde-se que desde a entrada em vigor da nova lei, os inquilinos e representantes empresariais e do comércio têm denunciado vários casos de despejo abusivo, em que o proprietário invoca a realização de obras e que acabam por levar ao desaparecimento de estabelecimentos comerciais. Nestes casos a Lei não ta contempla quaisquer compensações por investimentos que os inquilinos já tenham feito nos imóveis - por vezes significativos no caso, por exemplo, de restaurantes e hotéis - nem qualquer salvaguarda ou apoio social para pagar a credores ou indemnizar trabalhadores. 

Por outro lado, a Comissão sugere um alargamento do prazo de pré-aviso, de seis meses para um ano, no caso de denúncia para demolição ou realização de obra de remodelação ou restauro profundos. Neste caso, o mesmo prazo se passaria a aplicar sempre que o senhorio denunciasse o contrato para sua própria habitação ou dos seus filhos. 

A Comissão das rendas integra representantes de proprietários e inquilinos, comerciantes, setor imobiliário e do próprio Governo e é liderada pelo jurista Rui Medeiros. Neste caso, as preocupações foram apresentadas pelas associações de inquilinos, pela Confederação do Comércio e Serviços, sendo que as associações de proprietários não consideraram que a questão fosse significativa, por envolver poucos casos. 

Período transitório mais alargado 

Outra questão apontada no não habitacional - e esta de caráter mais generalizado - tem a ver com o regime transitório de salvaguarda previsto na Lei para as microentidades. Este está fixado em cinco anos, mais dois, já que ao fim dos cinco anos - se outra coisa não for decidida entre as partes - o contrato transita para o NRAU e terá a duração de dois anos. Dois anos que, depois, nada garante que venham a ter continuidade, já que o senhorio poderá então, unilateralmente. denunciar o contrato, alegam os inquilinos. A Comissão propõe que o período transitório passe a ser de dez anos ou, pelo menos, que aos atuais cinco, se sucedam outros cinco. 

A Comissão vai ainda elaborar um outro relatório, desta feita sobre o arrendamento habitacional. Um e outro deverão estar na base das conclusões que o Governo se comprometeu a apresentar à troika no primeiro trimestre deste ano. Depois disso é que o Governo avançará com eventuais alterações à lei, sendo que a base serão sempre os relatórios da Comissão de monitorização. Esta escreve, de resto, que "cabe no âmbito do seu mandato a apresentação ao Governo de propostas de reflexão ou de medidas adequadas ao desbloqueio" de dificuldades encontradas. 

Proprietários Contra alargamento do período transitório 
A Associação Lisbonense de Proprietários (ALP) rejeita o aumento para 10 anos do prazo de transição nos contratos de arrendamento comerciais. Num comunicado esta entidade sustenta que não há "qualquer justificação na monitorização que até agora tem a sido efectuada para se apresentar uma solução deste tipo" e afirma que tal medida significaria "um retrocesso gigantesco na reforma do arrendamento urbano, e um retorno ao regime de congelamento de rendas". A ALP alega ainda que, tendo em conta a amostra obtida junto dos seus associados? "95% dos aumentos de renda nos contratos não habitacionais foram bloqueados pelo estatuto de microentidade, pelo que a proposta terá um impacto negativo gigantesco na reforma, representando o prolongar por mais uma década do congelamento de rendas".

O que sugere a Comissão de monitorização
  • ALTERAÇÃO DAS REGRAS DO DESPEJO PARA OBRAS As regras que regulam o fundamento do despejo por demolição ou obras de remodelação ou restauro profundo devem ser revistas por forma a evitar situações abusivas de empresas que se vêem obrigadas a fechas, lançando pessoas no desemprego e sem quaisquer indemnizações ou salvaguardas. 
  • ALARGAMENTO DO PRÉ-AVISO DE SEIS MESES PARA UM ANO Da mesma forma, para dar às empresas capacidade de reacção, a Comissão sugere alargamento do prazo de pré-aviso de despejo. Atualmente são seis meses, deveria passar a um ano. 
  • DEZ ANOS DE PERÍODO TRANSITÓRIO A lei estipula cinco anos para as microempresas se adaptarem à nova renda, durante os quais esta fica limitada a 1/15 do valor patrimonial tributário (VPT) do imóvel. A Comissão sugere que passem a ser dez anos, por forma a diminuir a incerteza para a empresa. 
  • INQUILINOS DEVEM PODER O VALOR PATRIMONIAL Urna vez que o VPT é relevante para a fixação da renda no período transitório (1/15 se não houver acordo), a comissão sugere que se pondere a possibilidade de o arrendatário poder pedir uma reavaliação se não concordar com o valor estabelecido pelas Finanças. Atualmente, só o senhorio o pode fazer.
  • PRÉDIOS DEVOLUTOS SEM CULPA DO PROPRIETÁRIO Quando um prédio estiver devoluto mas esse facto não seja imputável ao proprietário, então deverá haver uma exceção à regra do IMI que prevê o pagamento de imposto a triplicar.
  • COEFICIENTE DE LOCALIZAÇÃO O método de cálculo do IMI faz quer com que alguns imóveis saiam muito penalizados pela localização. A comissão sugere também que isso seja alvo de "ponderação".
Quatro casos denunciados pela AHRESP
Os representantes da hotelaria e da restauração afirmam que há aumentos exagerados de rendas e alertam para os contratos que ficam com fim à vista, marcando o desaparecimento dos estabelecimentos.

Hotel Aliados 
Um hotel de charme, localizado no centro do Porto, num edifício histórico, o Hotel Aliados viu a renda disparar de 1.800 euros mensais para 6.800 euros (mais 278%). Em 2008 a empresa tinha feito obras de melhoramento e investira cerca de um milhão de euros. O contrato é agora de apenas cinco anos e o senhorio já avisou que findo esse período quer "tomar para si o edifício e o próprio negócio". 

Café Magestic 
Ícone da cidade do Porto, o Magestic abriu em 1921 e foi adquirido em 1992 pelos atuais proprietários que o recuperaram, um investimento de 530 mil euros. A renda foi agora atualizada, passando de 969 euros mensais para 9.000 euros (mais 828%). Neste caso, o proprietário do imóvel aceitou um contrato por 20 anos, mas o arrendatário afirma que o valor da renda, que se viu obrigado a aceitar, é demasiado elevado.

Café Restaurante Guarany 
Conhecido como café dos músicos, abriu portas em 1933 e foi adquirido em 2003 pelos atuais arrendatários que, na altura, investiram cerca de um milhão de euros. A renda, que era de mil euros, foi aumentada para 3.500 euros e o novo contrato foi feito apenas por cinco anos. A marca Guarany, diz a AHRESP, "é de uso exclusivo do proprietário, pelo que o fim do contrato de arrendamento, significará também o fim do Café Guarany". 

Hotel Vera Cruz 
Num edifício histórico, este hotel foi obrigado a fazer obras de vulto para não perder as suas duas estrelas. Gastou meio milhão de euros. A renda, de 2.400 euros, passou para 4.000. Daqui a cinco anos, o contrato finda porque o proprietário quer o prédio.







Fonte: Negócios

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