21 janeiro 2018

Profissionais alertam para consequências a curto prazo da euforia que rodeia o mercado


Para os profissionais ligados às várias áreas do mercado, 2017 foi certamente um dos melhores anos de que há memória no setor imobiliário. O mercado está na expectativa de que venham a bater-se novos recordes, continuando a fase ascendente de crescimento verificado desde 2014. Contudo, a euforia vivida pode também vir a ser prejudicial para este mercado, que viveu recentemente um período de recessão profundo, já que algumas empresas e, também, alguns bancos (recorde-se os avisos recentes do Banco de Portugal, sobre a concessão de crédito à habitação), parecem ter esquecido rapidamente. 

O Imobiliário pediu a opinião de vários profissionais, ligados aos diversos segmentos do imobiliário, e deixamos o contributo dos que responderam à questão de balanço e expetativas para 2018.

Na opinião de José António Teixeira, presidente do conselho de administração da RAR Imobiliária, “têm-se verificado melhorias muito significativas nos índices mais relevantes do mercado imobiliário em 2017. O crescimento contínuo da economia do país, aliado a factos que favorecem esta área de negócio, traduz-se num balanço muito positivo. A oferta continua a não acompanhar a procura, que é cada vez maior, o preço das casas volta a acelerar, o acesso ao financiamento bancário direcionado para a aquisição de imóveis residenciais teve um aumento muito expressivo e o índice de confiança das famílias atingiu um novo recorde.
Expectativas para o próximo ano (…). Esperamos que este cenário favorável se mantenha, até porque é importante não esquecer o contributo que o imobiliário tem para o PIB nacional, que tem aumentado há 14 trimestres sucessivos, e também para a taxa de emprego. No médio prazo, prevejo que haja um equilíbrio entre a oferta e a procura que conduzirá, certamente, a uma desaceleração dos preços e que contribuirá, sem dúvida, para a consolidação do mercado”.

Na opinião de José Velez, diretor executivo da Prime Yield, “a conjuntura económica internacional favorável teve impacto ao nível da confiança interna na prossecução de operações de investimento em imobiliário por parte de investidores nacionais e internacionais; a estabilidade política interna, na sequência de um início de período de governo com alguma incerteza, veio potenciar maior confiança por parte dos investidores; os indicadores económicos internos, com boa performance, potenciam maior facilidade e qualidade na atribuição de crédito para novos projetos; a segurança interna, clima e aumento constante do interesse por parte de turistas potencia maior procura de imóveis. 
A fatores de maior procura correspondem incrementos de oferta nos respetivos segmentos, tendo assim impulsionado o setor da construção; a continuação de incentivos a operações de reabilitação nos centros históricos potenciam maior oferta para resposta a procura interna e externa e também torna as cidades mais atrativas para a resposta ao crescimento de interesse turístico que acaba também por potenciar maior procura, quase que numa análise cíclica destes fatores.
As minhas expectativas para 2018 são a continuidade no caminho traçado em 2017, mas com possibilidade de haver alguma correção de mercado derivado de situações que decorrem de eventual alteração de incentivos fiscais em França que possam de alguma forma alterar o interesse do mercado francês por imóveis em Portugal, e também pela estratégia de tributação de património e de atividades relacionadas com o Alojamento Local que poderão desincentivar alguns investimentos e atividades atuais nesse setor”.

Francisco Bacelar, presidente da ASMIP - Associação da Mediadores do imobiliário de Portugal, considera que, “na sequência do que já vinha acontecendo, em 2017, o mercado imobiliário tem estado muito ativo, em especial em Lisboa, Porto e Algarve, onde os preços têm subido acima das expetativas, a maior parte sem recurso a crédito e fruto do investimento estrangeiro, mas também da aplicação das poupanças por investidores portugueses, em desfavor dos depósitos com taxas de juro muito baixas e pouco atrativas.
Os Vistos Gold tiveram a sua parte importante neste investimento, facilitando o escoamento e valorização de ativos que não tinham procura, e proporcionando reabilitações extraordinárias que estão a mudar a face das nossas cidades. Contudo, a procura e a inerente subida dos preços impossibilitam a aquisição pelos cidadãos nacionais, onde tradicional e naturalmente se encontrava a maioria dos clientes.
Estes investimentos, só por si, têm sido importantes para toda a economia, através da utilização dos recursos humanos, e da venda de todo o tipo de materiais de construção e mobiliário, no entanto a reorientação destes imóveis para o Alojamento Local tem ajudado a desertificar as cidades dos seus nativos, o que, não sendo positivo, é bem menos preocupante do que a subida dos preços das rendas, e a falta de imóveis que também provoca.
Na atividade da mediação imobiliária e como já aconteceu noutras épocas de aquecimento do mercado imobiliário, têm-se multiplicado o número de profissionais e das licenças para o exercício de mediação (1400 licenças concedidas em 2017), mas também do exercício ilegal da atividade, o que é bastante preocupante, e prejudica o bom nome da mesma.
Para 2018, não esperamos grandes diferenças em relação ao que vem acontecendo, a não ser que algumas medidas previstas na Nova Geração de Política de Habitação sejam implementadas e venham criar, como se espera, condições para a disponibilização de mais imóveis para arrendamento, preços menos inflacionados, quer no arrendamento quer na compra, e ainda maior mobilidade, também ela essencial no mercado de trabalho, e na adaptação às diversas fases da vida ativa das famílias”.

Na opinião de Nuno Ascenção e Mª João Ascenção, fundadores da Outside the Box, “2017 foi um ano positivo para o imobiliário. Um aumento da procura, dos preços e da produção.
Mas, se o ano de 2017 é marcado por algo, será pelo facto de coletivamente nos estarmos a esquecer da crise de 2008. Desaparece assim o pessimismo, mas são também esquecidas as lições aprendidas. Passamos rapidamente de uma perspetiva demasiado cautelosa para uma possivelmente demasiado otimista.
Ao contrário de algumas opiniões, não nos parece que exista uma bolha no imobiliário. Entenda-se, não esperamos uma desvalorização súbita do mercado. No aquisições que apostam na subida dos preços, ou que não se revestem da cautela desejável.
Se, por um lado, os centros das principais cidades finalmente entram na regra, patente em todo o mundo, de preços mais elevados, por outro lado, esta subida não é sustentável nos restantes territórios, por serem praticados valores inacessíveis à maioria dos portugueses. Seja por esta razão, ou pelo incremento da oferta, será expectável uma correção das tendências atuais de mercado, com possíveis perdas para quem seja apanhado numa ação especulativa. Difícil de dizer se ocorrerá já em 2018, onde ainda é possível um acréscimo dos preços praticados.
A escalada da procura no mercado imobiliário face a uma estagnação da oferta nos últimos anos tem conduzido à proliferação de construções de baixa qualidade, especialmente na reabilitação. Não foi ainda 2017 que trouxe uma mudança desse aspeto. Será expectável, com o início da conclusão de maiores investimentos imobiliários durante 2018, e consequentemente o aumento de produto disponível, que a tendência comece a mudar no sentido de aquisições mais criteriosas.
Numa nota sobre o setor da construção, temos assistido a um aumento significativo dos preços de construção, em grande parte pela carência de mão-de-obra. Mais do que os efeitos negativos, com o crescimento da oferta de trabalho bem remunerada, fica na expectativa o regresso de um bom número dos trabalhadores que se deslocaram nos últimos anos para o estrangeiro”.

Rui d’Ávila, administrador do grupo Ferreira, destaca que, “só posso responder pelos mercados de Porto e Lisboa e é claro que foram mercados muito dinâmicos, com procura muito elevada em qualquer dos setores – residencial, escritórios e hoteleiro. Voltou o crédito hipotecário e maiores índices de confiança na economia, o que suscitou vontade de investir em casa própria, a par com os investimentos para rendimento individual. Várias empresas procuraram instalações no Porto, onde os escritórios ainda são baratos, apesar de a oferta ser muito reduzida. Os hotéis estão com taxas de ocupação elevadas e com baixa sazonalidade, havendo várias marcas a querer instalar-se em Portugal. Os preços de venda e as rendas têm tendência para subir, devido à procura, mas também ao aumento do custo de construção, que está em aceleração. Com boas garantias de pagamento por parte dos utilizadores finais e grandes quantidades de dinheiro disponível por parte de investidores, as perspetivas são boas para os promotores imobiliários, talvez das melhores de sempre devido à internacionalização que se verifica. Resta saber qual vai ser o comportamento desses investidores internacionais depois da saída do RU (Reino Unido) e da alteração das taxas de juro prometidas pelo BCE”.

Na opinião de Miguel Poisson, diretor da Sotheby’s, “o ano 2017 foi um ano muito positivo para o sector imobiliário. “O crescimento das vendas em Portugal em 2017 será de cerca de 20% face a 2016 e prevemos que 2018 continue a crescer a 2 dígitos.
Estes crescimentos devem-se a várias razões. Aumento generalizado dos níveis de confiança das famílias em Portugal que as levou a tomar decisões de compra ou mudança de casa (muitas dessas decisões ficaram ‘congeladas’ nos últimos anos devido aos naturais receios que sempre acompanham os períodos de crise); a concessão de crédito à habitação está a ter em 2017 um crescimento de cerca de 40% face a 2016. É um crescimento elevado que possibilitou a muitos compradores e investidores a compra de casa (1ª habitação, 2ª habitação ou investimento); a notoriedade do nosso país continuou a aumentar em 2017 e os prémios sucedem-se, o que acaba por atrair muitos estrangeiros, (sendo as principais nacionalidades os franceses, os ingleses e também os brasileiros. Outras nacionalidades estão a despontar, tais como os suecos, suíços, sul-africanos (emigrantes), venezuelanos (emigrantes), belgas, russos e chineses. É de prever que, dentro de 1 ou 2 anos, os americanos entrem em força no nosso país.
O aumento do turismo deve-se a um excelente trabalho de divulgação do país que atrai pessoas que começam por visitar Portugal e a descobrir oportunidades de investimento (aproveitando os interessantes regimes fiscais, tais como o Golden Visa ou o regime fiscal para residentes não habituais). Alguns destes estrangeiros acabam mesmo por trabalhar em Portugal, tirando partido das oportunidades de uma economia que está a crescer. Portugal está na moda e continuará a atrair muitos estrangeiros não só para Lisboa, Porto e Algarve mas também para muitas outras cidades de Portugal onde o preço por m2 é mais baixo. Temos um país extraordinário que oferece estabilidade, segurança, hospitalidade, um clima fantástico, infraestruturas muito boas (estradas, hospitais, universidades, aeroportos, etc.), uma ótima gastronomia e uma história muito rica.
O imobiliário continua a ser o principal ‘setor refúgio’ para os investidores que não encontram outras soluções de investimento com risco controlado que ofereçam uma rentabilidade tão elevada. Estão a surgir vários projetos de novas construções que se pretende que colmatem o défice de oferta que existe em várias zonas do país face à procura existente”.

Na opinião de João Brion Sanches, partner / CEO da Norfin, “2017 foi o quarto ano consecutivo de crescimento generalizado dos preços dos ativos, no seguimento da recuperação da maior crise de crédito dos tempos modernos no mundo ocidental. Neste momento os preços dos ativos em geral estão a começar a aproximar-se dos níveis verificados no pico de 2007. Passaram 10 anos. Notamos no entanto que a rentabilidade dos ativos se encontra a mínimos históricos, justificada por um contexto de taxas de juro zero a nível global. Isto significa que, em termos gerais, mais de 85% da recuperação dos preços é o reverso da redução da rentabilidade exigida pelos compradores, que por sua vez é o reflexo das taxas de juro muito baixas. Apenas uma pequena parte da recuperação é justificada por uma melhoria dos fundamentais, isto é, um crescimento das rendas e da ocupação dos ativos. As rendas continuam muito baixas, em muitos casos abaixo dos mínimos que justifiquem a reabilitação ou construção – caso dos escritórios e logística. Se, por um lado, esta recuperação dos preços é positiva para o mercado em geral, há que ter algum cuidado na análise da sustentabilidade da tendência de taxas de juro zero.
Por outro lado, acreditamos que existem sectores e subsectores do mercado onde as avaliações ainda estão baixas e em que é possível extrair rentabilidades interessantes sustentadas por um crescimento sólido dos fundamentais vindos de uma base muito baixa. São o caso do turismo, do comércio de rua nos centros de Lisboa e Porto e de alguns setores do mercado residencial, sustentado por procura internacional. Apesar das baixas rentabilidades, acreditamos, assim, que esta tendência se manterá durante o próximo ano. Acreditamos também que, numa base seletiva, o mercado imobiliário português continuará a apresentar oportunidades interessantes para os investidores”.

Na opinião de Hugo Santos Ferreira, vice-presidente executivo da APPII – Associação Portuguesa de Promotores e Investidores Imobiliários, “2017 foi certamente um dos melhores anos de que há memória no setor imobiliário, esperando que se venham a bater novos recordes, adivinhando-se a continuação do crescimento verificado desde 2014.
Falando de perspetivas para o próximo ano, penso que o debate se deve centrar já não tanto no ano que agora se vai iniciar – o qual se prevê voltar a registar excelentes números não trazendo por isso preocupações de maior –, mas naquilo que iremos fazer a curto prazo com reflexos nos anos seguintes. Na verdade, e num momento de grande entusiasmo no setor imobiliário, é importante que haja algumas vozes que tragam alguma calma e ponderação ao setor. Por isso, é necessário que se acabem com as euforias desmedidas, e, a meu ver, excessivas, de alguns profissionais do sector, o que, como se sabe, acaba por ser sempre contraproducente, e que se passe a viver o mercado de uma forma saudável e com preocupações de sustentabilidade e de um mercado de longo prazo”.

Para José de Matos, secretário-geral da APCMC – Associação Portuguesa de Comerciantes de Materiais de Construção, “o ano 2017 foi bastante positivo e terá superado as expetativas mais otimistas. Esta dinâmica do mercado imobiliário, muito assente no turismo e no investimento estrangeiro, deverá estender-se, em 2018, ao setor residencial tradicional, com reflexos nos negócios de toda a fileira da construção. Esperamos crescimentos da ordem dos 7% nos trabalhos de reabilitação de edifícios residenciais e de mais de 3% na construção nova de habitação, que poderá mesmo vir a ser superior se a banca regressar ao financiamento da promoção imobiliária. Nestas condições, o crescimento do setor dos materiais de construção deverá situar-se à volta dos 8%”.

Fonte: Caderno Imobiliário da VidaEconómica

0 comentários:

Enviar um comentário

Obrigado pelo seu comentário.