09 dezembro 2016

O alojamento local é comércio ou habitação?


Os Tribunais da Relação de Lisboa e Porto não estão de acordo no que respeita aos contornos do alojamento local. Mas as decisões ainda não geraram jurisprudência. O assunto pode só parar no Supremo. São duas decisões em sentido inverso. O Tribunal da Relação (TRL) de Lisboa considera que os condomínios têm poder para bloquear o alojamento local (AL) no prédio, a Relação do Porto descarta este cenário. Os contornos das providencias cautelares são também diferentes.


Em Lisboa, é a proprietária a contestar uma deliberação do condomínio - tomada em Maio - a proibir a existência de AL. O TRL, após recurso do condomínio, acabou par considerar esta medida "valida e eficaz". 

Para justificar a decisão, o tribunal vai mais longe e afirma que "o destino comercial dado a fração não é compatível com o fixado no titulo de propriedade horizontal, que a destina a habitação". 

A instanciá define que "a condómina viola a lei, praticando uma actividade comercial" e sugere que a mesma recorra ao arrendamento "exclusivamente habitacional" para obter rendimentos. O facto de o AL estar licenciado pela Câmara de Lisboa e Turismo de Portugal e considerado "irrelevante". 

Tiago Mendonça de Castro, sócio da PLMJ e especialista na área imobiliária, explica ao Negócios que esta decisão não vem proibir a proprietária de continuar a sua actividade. Apenas não considera válida a vontade do condomínio.

Se a proprietária não se conformar ou o condomínio insistir na suspensão do AL, o conflito não pode arrastar-se nos tribunais, "Aí passa-se a discutir a questão de fundo", lembra o advogado, considerando que a TRL "se estica um bocadinho sobre o conteúdo da deliberação".

A "questão de fundo" já se discute num acórdão do Tribunal da Relação do Porto (TRP), com desfecho diferente. O condomínio exigia a suspensão do alojamento local e uma coima diária de 150 euros ao proprietário. 

O tribunal decidiu que "não existe, em principio, impedimento a que o seu proprietário a afecte [fração] a alojamento de turistas". Porque? "O conceito de alojamento está contido no conceito de habitação. A pessoa alojada não pratica no local de alojamento algo que nela não pratique quem nele habita: dorme, descansa, pernoita, tem as suas coisas."

Quanto às queixas de estranhos no prédio, barulho e desgasto nas zonas comuns, o TRP acredita que o impacto dos turistas pode ficar "mesmo aquém do que seria feito pelos membros desse agregado" que ocuparia a casa. 

Mendonça de Castro vê esta decisão como mais "relevante", acrescentando que quem recorre ao AL "não vai fazer mais do que habitar temporariamente". "É uma subespécie de arrendamento", classifica. 

Já que as providencias cautelares "não geram jurisprudência", o advogado acredita que, mesmo que os tribunais vão definindo uma tendência, o assunto poderá "escalar ate ao Supremo Tribunal de Justiça". Só aí se tornará "caso julgado" e definira uma regra - após três decisões da instanciá - a aplicar em todas as disputas do género. 

Até lá, corre-se o risco de o tema "resvalar para uma discussão perigosa": quem é que pode ou não entrar no prédio?

Fonte: Negócios

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