28 janeiro 2017

Relatora da ONU sobre habitação em Portugal diz que há casos “deploráveis”


Leilani Farha esteve no final de 2016 em Portugal a avaliar o impacto da crise na habitação. Foi a Lisboa, Porto e arredores das duas cidades. "Estou surpreendida? Talvez não. Estou destroçada? Absolutamente. Acho que tem solução? Facilmente".


Natural do Canadá, advogada, Leilani Farha é Relatora Especial da Organização das Nações Unidas (ONU) e esteve em Portugal com a missão de avaliar o impacto das medidas de austeridade nas populações vulneráveis. Foi às “ilhas” do Porto, ao bairro 6 de Maio (Amadora) ou ao bairro da Torre (Loures) “onde não há luz há dois meses” e onde “a comunidade cigana também não tem água”, conta. “Vivem no escuro. E estava tão escuro. Vivem com lixo ao lado. São condições muito, muito duras”, confessa a também diretora-executiva da ONG Canada without Poverty.

“DEMOLIR CASAS SEM QUE AS PESSOAS TENHAM SÍTIO PARA IR É UMA VIOLAÇÃO DO DIREITO À HABITAÇÃO CONDIGNA. NÃO SE PODE DEMOLIR UMA CASA SABENDO QUE ESSA PESSOA VAI FICAR SEM ABRIGO: ISSO É UMA VIOLAÇÃO CLARA DO DIREITO À HABITAÇÃO CONDIGNA”

“Uma coisa que não podemos fazer é culpar a austeridade de tudo. Portugal tem uma história. Tive que me informar sobre as antigas leis de arrendamento que causaram alguns problemas no setor, e que depois colocaram alguma pressão no mercado imobiliário — se não há suficiente mercado de arrendamento isso pode causar problemas.

Uma das minhas recomendações é que o Governo central e local atuem imediatamente em algumas áreas. À luz da lei internacional dos direitos humanos algumas situações são tão horríveis que têm que ser atacadas imediatamente. ”

“É NECESSÁRIO IMPLEMENTAR REGULAMENTAÇÃO PARA CONTROLAR A ESPECULAÇÃO E O NÚMERO DE ALUGUERES TEMPORÁRIOS, EM LISBOA E NO PORTO. NÃO É BOM PARA AS COMUNIDADES, ACABAM APENAS COM TURISTAS NOS CENTROS DAS CIDADES”

“NÃO PODEM EXISTIR PESSOAS COM MEDO DE NÃO SABEREM ONDE VÃO VIVER AMANHÃ. ISSO NÃO CRIA SEGURANÇA NUMA SOCIEDADE”

Hoje a tendência é deixar as pessoas viverem onde estão, reabilitando. Imaginamos que há uma boa razão para a comunidade não ficar ali. Quando a casa é demolida tem que haver a garantia de que as pessoas têm para onde ir a longo prazo. E a casa tem que ser adequada: e com adequada, eu quero dizer que protege dos elementos exteriores, é acessível em termos financeiros, está perto de empregos, escolas, etc. Há obrigações que a Câmara da Amadora não seguiu.

Sobre a turistificação, acho que é necessário implementar regulamentação para controlar a especulação e o número de alugueres temporários, em Lisboa e no Porto. Não é bom para as comunidades, acabam apenas com turistas nos centros das cidades. Há vários modelos: pode-se forçar uma percentagem de rendas acessíveis; dar incentivos fiscais a quem tem alugueres de longo-prazo, por exemplo. Em Vancouver estão a introduzir o aumento de impostos para as casas devolutas.

Fonte: Revista Pontos de Vista

0 comentários:

Enviar um comentário

Obrigado pelo seu comentário.